Mestre de obras toma o lugar do engenheiro(O Estado do Tapajós)-

O Mestre de Obras ainda é o profissional mais presente nas obras de construção civil desenvolvidas em Santarém. Em muitas das vezes, ele executa funções que deveriam ser feitas por um engenheiro ou por um arquiteto. A situação acontece, em grande parte, nas pequenas obras como construção e ampliação de casas e levantamento dos famosos 'puxadinhos' no fundo dos quintais. Essas obras, geralmente, não são alcançadas pela fiscalização do poder público municipal.
"Construir minha casa só com a ajuda do mestre de obras. Mas considero que foi bem feita. Ele desenhou a planta da casa e tudo. Se fosse pagar para um engenheiro fazer isso, pagaria uma fortuna", conta Geraldo, que pediu a reportagem para ser chamado apenas pelo primeiro nome. Ele teme represália por parte dos órgãos públicos e também não quer expor o seu mestre de obras.
A casa de Geraldo tem sala, dois quartos, um banheiro, garagem e cozinha. Ele informou que gastou cerca de R$ 25 mil na obra. "Ainda não foi terminada. Sabe como é. Ainda faltam alguns acabamentos. Devo gastar mais uns dez mil reais para terminá-la", explica.
A falta do acompanhamento do profissional competente e com formação acadêmica levanta uma questão: essas casas são seguras? Essas construções oferecem algum tipo de perigo às famílias que nelas residem? Quem contrata o mestre de obras, acha que não.
"Aquele prédio de Belém foi construído por um engenheiro, uma firma de engenheiros, e olha o que aconteceu. Veio abaixo. Sei que não é culpa total do engenheiro e sei também que a presença do profissional é importante, mas só quero dizer que qualquer um profissional tá sujeito ao erro, mesmo com formação de universidade", argumenta Geraldo, ao se referir à tragédia do Real Class que desabou neste último sábado (29), em Belém, matando três pessoas.
"Fazemos essas casas, mas não extrapolamos. Sabemos de nossos limites. Quando a obra é grande demais e necessita de um projeto mais detalhado e complicado é claro que não vamos aceitar fazê-la sem o acompanhamento de um engenheiro ou arquiteto", justifica Seu Manoel, mestre de obras que também pediu para não ser identificado pela reportagem por medo de represálias.
Manoel conta que a profissão do 'mestre de obras' nasceu de pedreiros mais experientes que eram o braço-direito dos engenheiros. "Como o engenheiro não fica todo o tempo na obra, ele confia essa postura ao mestre de obras que acaba aprendendo muita coisa do que o engenheiro aprendeu na universidade", explica Manoel, acrescentando que há anos essa situação chegava a ser normal pela escassez de profissionais, mas que hoje está diminuindo bastante. "Limitada aos bairros da periferia", emenda.
O arquiteto Ary Rabelo, que possui 31 anos de formação profissional, confirma a afirmação de Seu Manoel. "O engenheiro ou o arquiteto estão cada vez mais presentes e os mestres de obras sabem até aonde eles podem ir. São poucos que ousam a fazer construções com mais de um piso", esclarece Ary Rabelo.
Para o arquiteto, as casas construídas por mestres de obras não oferecem perigo se forem pequenas e seguirem as determinações básicas de construção. Ele explica que muitas delas apresentam rachaduras nas paredes por ficarem um pouco inclinadas ou terem uma fundação deficiente, pois, em alguns casos, o solo influência.
De acordo com o engenheiro Paulo Gilson, Inspetor do Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia (CREA) de Santarém, as obras devem sempre ter a presença de um profissional qualificado como exige a legislação pertinente à construção civil no município e no Estado.
Ele reconhece que o caso em questão tem acontecido com bastante freqüência em Santarém, mas garante que a fiscalização do CREA tem sido feita de forma intensa e que as obras flagradas sem o responsável técnico são paralisadas. "Realmente, aqui em Santarém tem essa cultura, mas não é o correto. Até para a segurança de quem vai morar nessas residências", afirma.
Segundo Gilson, o santarenense deve abandonar essa imagem de que a contratação de um engenheiro ou arquiteto encarece de forma demasiada a obra. Ele afirma que, em alguns casos, o engenheiro faz orientações, desenvolve e/ou acompanha os projetos. O Inspetor que o CREA fiscaliza apenas a responsabilidade técnica da obra e que a prefeitura municipal é que realiza a fiscalização sobre os requisitos necessários à emissão de licenças e alvarás. "Nossa fiscalização é sobre a responsabilidade técnica e ela é feita de forma ferrenha. A prefeitura também faz a sua fiscalização", explica Gilson.

Fiscalização Deficiente

Além do maior custo da obra, a falta de uma fiscalização mais intensa contribui para que obras pequenas sejam tocadas apenas pelo Mestre de Obras em diversos bairros da cidade, a maioria deles fica na periferia.
A deficiência na fiscalização é ocasionada pela falta de equipes técnicas no Setor de Fiscalização de Obras de Santarém, órgão vinculado à Secretaria Municipal de Infraestrutura (Seminf). A chefe do setor, Eliane Karaseck, afirma que possui apenas dois fiscais no momento para cobrir toda a cidade. Ela informou que quando a demanda é grande requisita mais equipes junto à Seminf.
Segundo Karaseck, a prefeitura municipal solicita alguns documentos para que o Alvará da construção seja liberado. "Exigimos a Assinatura de Responsabilidade Técnica (ART) do CREA, Licença do Corpo de Bombeiros em alguns casos, documento do terreno e o projeto", informou Karaseck.

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