Por que condenar uma mulher à morte na fogueira? > Nos séculos XVI e XVII, um simples boato era suficiente para pôr em ação o aparelho judiciário e todo o seu arsenal. Assim que a suspeita de feitiçaria surgia, o juiz devia intervir sem demora, e proceder a uma investigação e perseguição. Ora, essa suspeita não precisava de muito para ser provocada.

Qualquer morte, doença, acidente, qualquer acontecimento desagradável tendo, ou parecendo ter, um caráter imprevisto, podiam ser atribuídos ao sortilégio: uma mulher que parisse uma criança morta, uma queda de costas do alto de uma escada, o emprego, durante uma discussão, de expressões como “vá para o inferno”, mudança frequente de domicílio, ficar perturbado ou manter olhos fixos no chão, quando se falava de feitiçaria, frequentar ostensivamente as igrejas, possuir um terço em que a cruz tinha um dos braços quebrados, etc.

As crianças eram pressionadas a dar depoimentos contra seus pais e a presenciar a execução destes. Crianças pequenas, de três anos, eram aprisionadas, e crianças de oito eram executadas como feiticeiras. Não é possível falar de feiticeiras sem levar em conta a posição da mulher na sociedade cristã. Para os teólogos, a mulher é marcada pelo pecado original, causa de toda a miséria humana, agente do Diabo. Mas também é o seu corpo que perturba. O desconhecimento da fisiologia do corpo dá livre curso a todas as extravagâncias da imaginação.

Trecho de O Livro do Amor, de Regina Navarro Lins. Lançamento: 2012

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