Sexo somente à noite > No começo do século XI, o monge Helgaud relata uma anedota, na qual o rei dos francos, Hugo Capeto, lança de passagem seu manto sobre um casal que copulava entre duas portas de seu palácio: o mais privado de todos, o ato sexual, escandaloso se não era noturno, devia necessariamente escapar aos olhares, dissimular-se na obscuridade.

O historiador francês George Duby nos conta a confissão da dama de Monteillou, Béatrice de Planissoles, diante de um inquisidor. Ela diz ter sido violada durante a vida de seu primeiro marido, de dia, mas em seu quarto, ao abrigo de uma parede;

que, viúva e livre em seu castelo, seu mordomo, uma tarde, ao cair da noite, a esperava, escondido sob a cama e, apagadas as lareiras, introduziu-se em seu leito furtivamente, enquanto ela punha ordem na casa, que ela gritou, chamando as criadas que “dormiam perto dela, em outras camas, em seu quarto”;

que casada de novo, cedeu a um padre, de dia, mas na adega, ficando uma criada na espreita;

que, novamente viúva, atraiu para sua casa um outro padre, entregou-se a ele na entrada, perto da porta, à noite, e que, quando repetiu o ato de dia, esperou que suas filhas e criadas se tivessem afastado.

“Tal era o real da fornicação nessas casas povoadas, abertas; os amores ilícitos acomodavam-se muito bem ao gregarismo familiar, e era preciso que o amor fosse louco como o de Tristão e Isolda para que incitasse a fugir no espaço da estranheza, da desrazão”, conclui Duby.


Trecho de O Livro do Amor, de Regina Navarro Lins. Lançamento: 2012

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