PELO MALO (Cabelo Ruim) é o primeiro filme venezuelano lançado comercialmente no Brasil. Mesmo que não fosse por isso, justificaria todo o interesse que vem despertando desde o Festival de San Sebastián, onde ganhou o prêmio máximo. Em torno de um argumento central relativamente limitado – uma mãe desenvolve sentimento homofóbico diante do comportamento ambíguo do filho -, existe uma riqueza de observações sobre os personagens e o caldo cultural popular da Venezuela contemporânea. Enquanto a mãe, uma funcionária de segurança desempregada, tem comportamento masculinizado e moldado pela brutalidade do dia-a-dia caraquenho, o menino apresenta um misto de obsessão edipiana e confusão identitária. Sonha em ser "cantor de cabelo liso", ao passo que sua melhor amiguinha persegue a estampa das misses que continuam a povoar o imaginário do país. Ao redor deles, o caos urbano, tiroteios e o fantasma dos estupros. Enquanto isso, Chávez agoniza e desperta entre seus partidários uma onda de sacrifícios simbólicos, um dos quais consiste em raspar a cabeça pela recuperação "del presidente". Em meio à paranoia de gênero e à vulgarização dos sonhos de sucesso, o filme conta, na verdade, a história de uma sensibilidade especial que não encontra ambiente para florescer.

A diretora Mariana Rondón trouxe junto com o filme a tocante videoinstalação "Superbloque", em cartaz no Centro Cultural da Justiça Federal. O imenso prédio residencial visto em "Pelo Malo" estende-se num telão, filmado a certa distância. Munido de uma folha de papel que serve como tela pessoal, o visitante pode "aproximar-se" visual e auditivamente de algumas varandas. Do geral anônimo do superbloco ele passa à intimidade das células. No fundo, é a mesma operação que o filme promove à sua maneira.

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