Nos seus primeiros filmes Alain Resnais falava sobre o amor, a morte, a memória e a fantasia de maneira solenemente intelectual, como alguém que abria caminho na complexidade desses temas e ao mesmo tempo na linguagem cinematográfica. Em seus últimos trabalhos, ele continuou falando das mesmas coisas, mas numa chave lúdica e aparentemente despretensiosa, como alguém que já conhece todos os caminhos, principalmente aqueles que ligam o cinema ao teatro. AMAR, BEBER E CANTAR é mais um desses divertimentos cheios de segundas intenções. George Riley, o personagem principal, nunca aparece, assim como muitos outros que se escondem por trás das tapadeiras do palco ou da quarta parede da cena filmada. George, na verdade, é uma projeção dos desejos, lembranças, fantasias, segredos, temores e suposições dos amigos que recebem a notícia de sua morte próxima enquanto ensaiam uma peça amadora. Resnais brinca com esses espaços invisíveis aos outros, mas que carregamos como constituintes da nossa própria existência e só vêm à tona na forma de neuroses. Por trás das tapadeiras dessa comédia leve e amável, há um estudo delicado da alma humana. A última cena do último filme desse mestre é mais uma boutade com a morte, prova de que o artista se divertiu tanto quanto esse George que apenas podemos imaginar.

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