Sobre o documentário A VISITA DE YOANI


A visita da blogueira Yoani Sánchez ao Brasil, em fevereiro de 2013, catalisou as diferenças político-ideológicas por aqui. No Congresso, a oposicionista cubana foi acolhida por tucanos e louvada por extremistas de direita. Nas ruas, enfrentou protestos e acusações de mercenária e traidora por ativistas de esquerda. Teve palestras e eventos interrompidos pelo alarido das manifestações. A tudo ela respondia com um sorriso entre o cínico e o compreensivo, enquanto entoava loas à liberdade democrática que diz faltar em Cuba.
Um documentário sobre essa viagem teria três caminhos naturais a tomar: assumir a defesa de Yoani, alinhar-se com os protestos contra ela ou mostrar os dois lados em nome de uma suposta objetividade jornalística. A VIAGEM DE YOANI, de Peppe Siffredi e Raphael Bottino, optou por uma quarta via, certamente a mais interessante. Fez com que os acontecimentos da estada de Yoani no Brasil contaminassem a própria forma do filme. Assim é que conhecemos a blogueira em sua confortável casa de Havana (onde certamente não faltam "tomate e batata", como ela mais tarde alegará numa argumentação) e acompanhamos a história de sua ascensão internacional através de um design de imagens que mimetiza a estética da web em conexão lenta e precária. Após a chegada no Brasil, o filme mergulha na agitação que sua presença ocasiona. Flagra discussões calorosas entre brasileiros, testemunha a tensão dos cicerones (não tanto dela) diante dos protestos e as tentativas infrutíferas de abrir espaço para suas falas em espaços públicos.
Assim é que gradativamente Yoani vai saindo de cena no filme do qual é protagonista, sua voz vai ficando cada vez mais em off, e o Brasil é que vai ocupando todo o quadro. Há um momento intrigante perto do final, quando Yoani parece romper com os realizadores, acusando-os de entrevistá-la como se fosse num questionário do governo cubano. Não sei até que ponto essa ocorrência terá determinado a edição final do filme, cujo sentido aponta para uma viagem essencialmente frustrada. Sobre a personagem, fica o espaço para cada espectador julgá-la segundo o que pensa e os dados que conhece.

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