O prestigiado AS QUATRO VOLTAS (tradução equivocada do original "Le Quattro Volte"), do italiano Michelangelo Frammartino, está em cartaz no Rio, no Cine Joia. Sem diálogos - se não considerarmos as intensas conversas entre as cabras -, passa-se numa aldeia perdida na Calábria. Dizem que Pitágoras viveu lá, e que o filme segue sua teoria das "quatro vezes": o homem é mineral, depois vegetal, em seguida animal e por fim racional. Mas isso é exigir demais de um filme relativamente simples. É aquele tipo de obra tão concreta que logo sugere leituras filosóficas. O que vi foi, sim, uma sucessão de ciclos vitais: o velho pastor que morre no único dia em que não toma sua beberagem milagrosa, o cabritinho que nasce e aprende as primeiras lições de sobrevivência, a árvore altíssima que é cortada e reciclada em diversão dos homens e finalmente em carvão. Tudo termina ciclicamente com a fumaça que sai das chaminés e do que alimenta a vida na aldeia. O filme muda de gênero a cada uma dessas etapas: primeiro é uma fantasia camponesa à moda de Olmi/Taviani, depois uma aventura do tipo Mundo Animal, concluindo com um jeitão de documentário etnográfico. Em dado momento, o filme interrompe seu fluxo para uma cena memorável envolvendo um cachorrinho esperto, uma procissão de Via Sacra e um caminhãozinho desgovernado. Tudo muito elíptico, muito silencioso e muito misterioso no que diz respeito aos limites entre registro e encenação. Não acho que justifique toda a admiração que andei lendo por aí, mas que é uma cativante curiosidade, lá isso é.

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